O Brasil é um país de principios e talentos. Os principios, em regra, servem para ficar bonito na foto e fazer média com outros paises, e os talentos, também em regra, são usados para dar a volta nesses mesmo principios. E o Direito Penal sofre muito com isso. Muitos principios constitucionais existem no papel, mas na prática são ignorados de forma reiterada.
Vou direto ao assunto: o principio da individualização da pena.
Até pouco tempo a Justiça brasileira, de forma incoerente e inaceitável, tratava de forma igual condutas diferentes. Se o crime era Tráfico de Entorpecentes, pronto, era fechar os olhos e descer o martelo (na cabeça do preso). Tanto o primário, flagranteado com poucos cigarros de maconha quanto aquele reincidente que transportava centenas de quilos do droga eram impedidos de ver sua pena privativa de liberdade substituida por uma restritiva de direitos. A lei impedia o juiz de individualizar a pena. O pesadelo chegou ao fim.
A resolução No. 5/2012 do Senado, publicada em 16.02.2012, suspendeu a execução da expressão “vedada a conversão em penas restritivas de direitos”, contida no § 4º, do art. 33, da Lei nº 11.343/06. Tal expressão já havia sido declarada inconstitucional em decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal no julgamento do Habeas Corpus 97.256/RS, em 1 de setembro de 2010. Na prática, a resolução 5/12 do Senado estendeu os efeitos do julgamento do HC acima citado em respeito ao princípio da igualdade, bem como reafirmou que o princípio constitucional da individualização da pena impõe ao juiz, e somente a ele, o dever de motivar o cabimento ou não de penas alternativas no tráfico de droga. E o Amazonas já observa atentamente essa recente e vital alteração na legislação.
Em sessão extraordinária ocorrida na última quinta-feira (22/03/12) a Primeira Camara Criminal votou Acórdão da lavra da Desembargadora Carla Reis.
O Acórdão, provido de forma unânime pelos demais membros, Mauro Bessa e Encarnação Salgado, não somente substitui a pena privativa de liberdade por restritiva de direito, mas também aplica o parágrafo 4o do art. 33 e absolve os acusados dessa fútil acusação de “associação para o tráfico”.
Isso mesmo. Quem advoga na área criminal sabe o quanto o art. 35 da Lei de Drogas é usado de forma fútil e irreponsável. Qualquer casal, qualquer dupla, ou trio, presos juntos são denunciados e condenados por associação, independente da comprovação da associação. Na sentença atacada, um casal, marido e mulher, foram condenados por associação para o tráfico pelo simples fato de serem casados. A decisão abaixo repudia também esta conduta.
Torno público o Acórdão abaixo com o objetivo de multiplicá-lo. Que o belissimo voto sirva como norte, uma verdadeira bússola, um manual de como a Justiça deve ser prestada, de forma objetiva e responsável.

Desembargadora Carla Reis
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO AMAZONAS
GABINETE DA DESEMBARGADORA CARLA MARIA S. DOS REIS
Primeira Câmara Criminal
APELAÇÃO CRIMINAL n° 2011.001858-2
Apelante : João Batista dos Santos Pinheiro Junlor e Marta Idelina Pereira da Silva
Advogado : Dra. Danielle Aufiero M. de Paula – OAB/AM n’ 6945
Apelada Justiça Pública
Relatora : Des. Carla Maria Santos dos Reis
Revisora Des. Encanação das Graças Sampalo Salgado
Procuradot: Dr. Mauro Roberto Veraz Bezerra
EMENTA: PROCESSO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVAS CONFIGURADAS. DESCLASSIFICAÇÃO PARA O ARt 28. DA LEI N° 11343/2006. IMPOSSIBILIDADE. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DE ANIMUS ASSOCIATIVO ENTRE OS AGENTES.
1. Sendo o conjunto probatório apto à comprovação da materialidade e autoria delitivas do crime de tráfico de drogas, expresso no art. 33 da Lei 11343/2006, não deve ser acolhido o pedido de desclassificação da conduta criminosa para o delito de uso, previsto no art. 28 do mesmo diploma legal.
2. Ainda que os Sentenciados sejam usuários, o fato de eles consumirem droga não obsta a condenação por tráfico, se comprovado que também comercializam a substáncia, seja para sustento do próprio vício, seja para obtenção de lucro.
3. Para a condenação pelo crime de associação para o tráfico de drogas faz-se mister a comprovação da existência de animus associativo entre os agentes. O simples fato de serem casados e praticarem o comércio ilícito dentro de suas casas não é suficiente para a caracterização do crime.
4 A causa de redução de pena. insculpida no art. 33, §4°. da Lei no. 11343/06. tem como vetor quantitativo os critérios judiciais do art. 59, do CP, e art. 42. da Lei de Tóxicos. Assim, sendo todas as circunstãncias previstas em tais dispositivos favoráveis ao agente, tendo sido a pena-base fixada no mínimo legal, faz-se mister a redução no patamar máximo, ou seja 2/3.
5. Apelação criminal conhecida e parcialmente provida.
RELATÓRIO
Relatório às fls. 154/155 dos autos.
VOTO
Inicialmente, reconhece-se a presença dos pressupostos de admissibilidade recursal, passando dessa forma à análise do mérito da causa.
Pretendem os Apelantes, primeiramente, a desclassificação do crime do art. 33 para o do art. 28 da Lei n° 11343/2006, sob o argumento de que a substância entorpecente encontrada destinava-se ao consumo próprio, tendo em vista serem eles usuários de drogas.
Tem-se, primeiramente, que ainda que os sentenciados sejam usuárlos, o fato de eles consumirem droga não obsta a condenação por tráfico, se comprovado que também comercIalizam a substância, seja para sustento do próprio vício, seja para obtenção de lucro.
Não obstante, não há nada nos autos, além das declarações da defesa, que comprove a dependênoa química dos sentenciados, nem que estivessem sob efeito de entorpecentes quando da prisão em flagrante.
Por outro lado, verifica-se que foram encontrados na casa dos Recorrentes, juntamente com as porções de maconha e cocaina, todos os instrumentos normalmente utilizados para a prática de comercialização de drogas, tais como tesouras, barbante, pequenos sacos plásticos cortados ao meio e balança de precisão, além de dinheiro trocado.
Tais objetos demonstram que a droga encontrada destinava-se ao comércio e não ao consumo dos próprios sentenciados, tornando-se Incabível a desclassificação do crime de tráfico para uso de entorpecente.
A respeito do tema, colacionam-se as seguintes decisões dos Tnbunais de Justiça do Distrito Federal, Rio Grande do Noite, Mato Grosso do Sul, Santa Catarina e Minas Gerais:
As circunstâncias da prisão, a forma da acondIcIonamento da substancias, a quantidade e a diversidade de drogas apreendidas denotm que os entorpecentes se destinavam mercancia. (…) A prova do vicio no consumo de drogas nao obsta a condenação pela prática do tráfico, sobretudo porque se sabe que muitos usuários de drogas também acabam trafic ando para sustentar o vício. (TJ/RN 134948 RN 2010.0134949 Relator Juiz Nilson Cavalcanti (Canvocado), Data de Julgamento 27/09/2011, Câmara Criminal)
“A condição de usuário, por si só não afasta o delito do art. 33 da Lei de Drogas.”
(TJDF 20110110002828APR, Relatora SANDRA DE SANTIS, 1ª. Turma Criminal, julgado em 03/11/2011, Di 11/11/2011 p. 189)
‘Réu condenado por infringir o artigo 33. da Lei 11343/2006, eis que foi preso em flagrante em razão da apreensão na sua residência três pedras de cocaina pesando doze gramas e cinquenta e sete centigrasnas e mais de vinte quilos de várias substâncias normalmente usadas na preparação de drogas, tais como ácido bórico, lidocaina, cafeína e benzocaína, além de sacos plásticos e uma balança de precisão com resquícios do entorpecente. A cocaina apreendida, os os insumos e os instrumentos apreendidos no flagrante afastam a alegação de posse de droga para autoconsunso e evidenciam a destinação de tráfico.
(TJDF. 20100110658467ApR, Relator GEORGE LOPES LEITE, 1ª. Turma Criminal, Julgado em 31/03/2011. DJ 14/04/2011 p. 200)
“Descabido falar em Desclassificação para o crime previsto no artigo 28 da Lei si. 11.343/2006, quando a prova dos autos demonstra que o réu comercializava substancia entorpecente, diante da isgnificativa quantidade de maconha apreendida pelos os policiais, com suporte em denuncias anonimas, além de uma balança de precisão e uma faca com resquicios de droga.”.
(TJDF 2011011018308 APR, Relator ROBERVAL CASEMIRO BELINATI, 7a Turma Cnrninal, julgado em 28/0712011, DJ 09/08/2011*(2011 p. 744)
Apreensão de balança de precisão na casa do acusado da tráfico de entorpecentes configura a mercancia destes, mormente quando encontrados resquicios de entorpecentes na balança.”
(TJMS 2525 MS 2005.002525-9, Relator Desembargador Nildo de Carvalho, Data de Julgamento 13/09/2005, 1ª. Turma Criminal, Data de Pubacação 07/10/2005)
PLEITO DE DESCLASSIFICAÇÃO DO CRIME DE TRÁFICO PARA O DE USO PRÓPRIO FORMULADO POR UM DOS RÉUS. IMPOSSIBILIDADE. APREENSÃO DE DOIS QUILOS DE ENTORPECENTES E UMA BALANÇA DE PRECISÃO NA SUA RESIDÊNCIA. TESTEMUNHO DE UM COMPRADOR DE DROGA QUE ESTAVA NO LOCAL NO MOMENTO DO FLAGRANTE DANDO CONTA DA MERCANCIA. DESCLASSIFICAÇÃO IMPOSSIVEL.
(TJSC 638834 SC 2008.063838-4, Relator Roberto Lucas Pacheco, Data de Julgamento 19/01/2009. Terceira Camara Criminal.
“A quantidade elevada de maconha apreeendida com os apelados bem como a balança de precisão corroboram a tese agitada pela acusação, da destinação mercantil da droga.
(TJMG 100350710102720011 MG 1.0035.07.101027-2/001, Relator WALTER PINTO DA ROCHA, Data de Julgamento: 18/02/2009.
Ressalte-se, por oportuno, que a apelante Maria Idalina, de acordo com a certidão de fls. 52, responde a outra ação penal, também por tráfico.
Além disso, ela própria afirmou às fls. 89 que já foi presa e processada anteriormente e que seu ex-mando também era traficante, tendo sido morto por policiais.
Tais circunstancias denotam mais uma vez que a ora Recorrente sempre esteve envolvida com o comércio ilícito, seja praticando-o, seja permitindo que praticassem dentro de sua casa.
Assim sendo, entende-se que a pretensão dos Recorrentes, no que concerne à desclassificação do crime de tráfico, não merece provimento, pois a sentença Impugnada encontra amparo legitimo no conteúdo probatõrlo que Informa os autos, sendo suficientes para a configuração da materialidade e autoria do delito, os elementos de convicção colhidos nas fases inquisitória e judicial.
Superada esta questão, passa-se a analisar o pedido de absolvição do crime de associação para o tráfico, previsto no art. 35 da Lei 11343/2006.
Quanto à questão, assim insurgem-se os apelantes:
“Não é pelo fato de serem casados que automaticamente os apelantes responderão pelo cnme de associação. Na caracterização do delito de associação para o tráfico é preciso demonstrar que a associação os pessoas continha um ajuste prévio e duradouro, afastando-se, portanto, de mera reuniao ocasional, de co-autores, para a prática de determinado crime de tráfico ilicito de entorpecentes. A ausiencia de animus associativo afasta a incidencia do art. 35 da Lei, tratando-se de mera co-autoria”.
A doutrina brasileira se posiciona de forma semelhante, conforme se observa do seguinte trecho do livro de Vicente Greco Filho e João Daniel Rassi:
Parece-nos, todavia, que não será toda vez que ocorrer concurso que ficará caracterizado o crime em tela (art. 35 da Lei 11343/2006. Haverá necessidade de um animus associativo, isto é, um ajuste prévio no sentido da formação de um vinculo associativo de fato, uma verdadeira sociates scelerts, em que a vontade de se associar seja separada da vontade necessária à prática do crime visado. Excluido, pois, está o crime no caso de convergencia ocasional de vontades para a prática de determinado delito, que estabeleceria a co- autoria.
Desta mesma forma a Jurisprudencia pátria firmou entendimento, conforme se extrai dos seguintes julgados do Superior Tribunal de Justlça, e dos Tribunais de Justiça de São Paulo, Acre, Paraná, Minas Gerais e Espirito Santo.
‘O tipo previsto no artigo art. 35 da Lei 11343/2006 se configura quando duas ou mais pessoais reunirem-se com a finalidade de praticar os crimes previstos nos arts. 33 e 34 da norma referenciada. Indispensável, portanto, para a comprovação da materialidade, o animus associativo de forma estável e duradoura com a finalidade de cometer os crimes referenciados no tipo.”
(STJ Resp 1113728/SC, Rel. MIN. FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, JULGADO EM 29/09/2009, DJe 19/10/2009).
Não caracterização, no entanto, do delito de associação para o Tráfico, dada a ausencia do animus associativo, bem como da estabilidade e permanencia necessária para a configuração do delito.
(TJSP 337476020078260562 Relator Edison Brandão, 4ª. Camara Criminal).
Inexistindo nos autos comprovação de uma associação estável e duradoura liga pelo animus associativo dos agentes, impõe-se a absolvição do apelante da pena aplicável à espécie.
(TJAC. 2009.0029344, Relator: Da. Feliciano Vasconcelos, Data de Julgamento: 22/04/2010, Câmara Criminal)
Para a caracterização do delito de associação para o tráfico é indispensável a comprovação do animus associativo prévio prévio ou da estabilidade do grupo, caso contrário, impoe-se a absolvição por insufiencia de provas.
(TJPR. 495132-2. Reitor: Rogério Ribas. Data de Julgamento: 28/08/2008. 4ª. Câmara Criminal)
Para haver crime autonomo de associação para o tráfico é indispensávell que haja um animus associativo, isto é, um ajuste prévio no sentido de formação de um vinculo de fato, uma verdadeira societas scelerits em que a vontade de se associar seja separada da vontade necessária à prática do crime visado.
(TJES 10070012702. Relator: SÉRGlO LUIZ TEIXEIRA GAMA, Data de Julgamento: 18/03/2009. SEGUNDA CAMARA CRIMINAL, Data de Publicaçãoo: 16/04/2009)
Ia casu, consta da sentença recorrida, às fis. 102, que “há que se acolher o pedido de condenação em relação ao delito previsto na artigo 35 da lei n° 11.343/2006, uma vez que demonstrado o ânimo associativo de duas pessoas para o fim da prática reiterada de venda de substincla entorpecente”.
Não há, como se pode observar, a Indicação de qualquer elemento de prova ou fato que justifique tal conclusão, levando-se a crer que a condenação pelo crime de associação deu-se tão somente em razão de serem os recorrente casados e por ter sido a droga encontrada na resldência do casal.
Tais circunstancias, contudo, não são suficientes para a caracterização do crime, cuja materialidade deve ser comprovada por outros meios, como, por exemplo, e demonstração da existencia de divisão de tarefas entre os membros.
Para exemplificar cumpre destacar mais dois julgados, um do Tnbunal de Justiça de São Pauto e outro do Mato Grosso do Sul:
TRÁFICO DE DROGAS. INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. INDAMISSIBILIDADE. MATERIALIDADE E AUTORIA DEMONSTRADAS – PROVAS ROBUSTAS – CONDENAÇÃO MANTIDA. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO – INSUFICIENCIA PROBATÓRIA – ABSOLVIÇÃO.
(TJSP 39933920079260218 SP 0003993-38.2001.8.26.0218, Relator: Marco Antonio Marques, Data de Julgamento 27/01/2011.
APELAÇÃO CRIMINAL – PENAL. TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O TRAFICO – ALEGADA INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA – TRAFICÂNCIA PRATICADA DE FORMA ESTÁVEL – DIVISÃO DE TAREFAS – CONDENAÇÃO MANTIDA – PENA-BASE – CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS – FUNDAMENTAÇÃO INSUFICIENTE – REDUÇÃO DEVIDA – CUSTAS PROCESSUAIS – RÉUS HIPOSSUFICIENTES – ISENÇÃO- RESTITUIÇÃO DE DINHEIRO APREENDIDO – QUANTIDADE INCOMPATIVEI. COM AS RENDAS DOS ACUSADOS – INVIABILIDADE – PARCIAL PROVIMENTO
(TJMS 1206 MS 2010,001206-8, Relator: Des. Romero Osme DIAS Lopes, Data de Julgamento: 08/03/2010, 2ª. Turma Cnminal, Data de Publicação 30/03/2010).
Por outro lado, no caso em apreço apenas se sabe que os Recorrentes são casados e que ambos praticavam o tráfico de drogas. Não restou comprovado, contudo, se praticavam o delito de forma associada, organizada e estável, ou seja a partir dos elementos de prova não se pode vislumbrar se havia animus associativo entre os sentenciados.
Nesse diapasão, em atencão ao principio do in dubio pro reo, deve a sentença atacada ser reformada e os Recorrentes absolvldos do crime previsto no art. 35 da Lei n°i 11.343/2006.
Por todo o exposto, mantida a condenação de ambos os Recorrentes tão somente pelo crime de tráfico de drogas, previsto do art. 33 da Lei n° 11.343/2006, pssa-se a analisar a dosimetria e a pena e o pedido de causa de diminuição prevista no §4º. Do mesmo dispositivo legal.
Quanto ao apelante João Batista dos Santos Pinheiro Júnior, o douto Juiz sentenciante fixou a pena-base no mínimo legal, em 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-muta, a qual mantenho, em razão das circunstãncias do art. 59, do CP, e art 42, da Lei de Drogas, serem favoráveis a ele, nos exatos termos da sentença atacada.
Na segunda fase, não há agravantes ou atenuantes genéricas, de forma que a pena provisória se mantém em 5 anos.
Na terceira fase, contudo, verifica-se que merece provimento o pleito do Apelante, uma vez que se faz presente a causa de diminuição de pena prevista no art. 33 §4° da Lei de Drogas.
Dispõe o dispositivo que:
§ 4o Nos delitos definidos no caput e no § 1o deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, vedada a conversão em penas restritivas de direitos, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa.
In casu, analisando-se as certidões de antecedentes criminais do agente. às fls. 49/50, verifica-se ser ele pnmário e de bons antecedentes. Quanto aos demais requisitos, também, nada consta dos autos que possa comprovar ser ele dedicado a atividades criminosas ou Integrante de organização cnminosa.
Assim, sendo todas as circunstándas previstas no art. 59, do CP. e art. 42, da Lei de Tóxicos, favoráveis ao Apelante, tendo sido a pena-base fixada no mínimo legal, faz-se mister a redução no patamar máximo, ou seja, em 2/3, tanto em relação à sanção restritiva de liberdade, quanto à multa.
A propósito, o seguinte julgado do Supenor Tribunal de Justiça:
“Tendo o legislador previsto apenas os pressupostos para a Incidênda do beneficio legal, deixando, contudo de estabelecer os parametros para a escolha entre a menor e a maior frações indicados para a mitigação pela incidencia do paragrafo 4º. do art.. 33 da nova Lei de Droga, devem ser consideradas as circunstâncias Judiciais previstas no art. 59 do CP, a natureza a a quantidade da droga, a personalidade e a conduta social do agente. (STJ, HC 157.867 SP, Rel. Min. JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 22/11/2011).
Sendo assim, fixo a pena definitiva de João Batista dos Santos Pinhelro Júnior em 1 (um) anos 8 (Otto) meses de reclusão e 167 (cento e sessenta e sete ) dias multa, no valor de 1/30 do salário mínimo vigente à época dos fatos.
Quanto a apelante Maria Idelina Pereira da Silva, na sentença recorrida a pena-base foi fixada acima do mínimo, em 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 550 (Quinhentos e cinquenta) dias-multa, em razão dos maus antecedentes e por ter a personalidade voltada para a prática de crimes, com fundamento na certidão de fls 52. que aponta a existência de um ação penal em seu desfavor, em trâmite na 1ª. Vara da Comarca de Tefé.
Ocorre que tal ação penal ainda encontra-se em curso, não havendo, até o presente momento, condenação. Dessa forma, não se pode majorar a pena com base em tal processo, sob pena de afronta ao principio da inocência.
Tal entendimento, além de ser pacífico na jurisprudència dos Tribunais Superiores, é objeto de súmula no Superior tribunal de Justiça, conforme se observa a seguir:
É vedada e utilização da inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base.
(Súmula 444, TERCEIRA SEÇÃO, Julgado em 28/04/2010, DJ 13/05/2010)
A Jurisprudencia desta Corte entende que inquéritos policiais e ações penais em andamento não constituem , maus antecedentes, e nem personalidade desajustada, em obediência ao principio da presunção da inocência. Súmula 444.
STJ. HC 216. 517 SP, Rel. Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 27/11/2011, DJ 01/12/2011).
Não obstante, entendo que a pena não deve ser fixada no minirno legal, pois, Como dito anteriormente, a apelante sempre esteve envolvida, dlreta ou indiretamente com o tráfico, o que denota ser a sua conduta social reprovável e a sua culpabilidade elevada.
Observe-se que ela própna afirmou, fls. 89. que seu ex-marido também era traficante, tendo sido morto por policiais, o que denota que a Recorrente, embora conhecesse de perto as consequência do tráfico, continuou envolvida com o comércio ilícito, seja praticando-o, seja permitindo que praticassem dentro de sua casa.
Diante do exposto, reformo a pena-base imposta e fixo-a somente um pouco acima do minimo legal, em 5 (cinco) anos e 2 (dois) meses de reclusão e 525 (quinhentos e vinte e cinco) dias-multa.
Na segunda fase não há agravantes ou atenuantes genéricas, de forma que a pena provisória se mantém em em 5 (cinco) anos e 2 (dois) meses.
Na terceira fase, pelos motivos já expostos, aplico a causa diminuição de pena prevista no art. 33., 4º. da Lei de Drogas, tanto á sanção restritiva de liberdade, quarto à multa.
No entanto, tendo sido a pena aplicada um pouco acima do minimo, reduzo-a em patamar médio, em ½, fixando-a definitivamente em 2 (dois) anos e 7 (sete) meses de reclusão e 263 (duzentos e sessenta e tres} dias multa , no valor de 1 /30 do salário mínimo vigente à época dos fatos.
Considerando as recentes alterações provenientes do art. 1º da Resolução n° 05/2012, do Senado Federal, que suspendeu a execução da expressão “vedada a conversão em penas restritivas de dlreitos”, do §4º do art. 33 da Lei 11.343/2006, declarada inconstitucional, por decisão definitiva do STF, nos autos do habeas corpus no. 97.256/R5, e uma vez demonstraõos estarem presentes os requisitos do art 44. do CP, as penas privativas de liberdade aplicadas aos condenados deverão ser substituidas, cada uma, por duas restritivas de direito, sendo uma de prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas e a outra de InterdIção temporária de direitos, as quais devem ser cumpridas pelo mesmo períod da pena antes fixada (durante 1 ano e 8 meses para João Batista e durante 2 anos e 7 meses para Maria Idalina), facultado o cumprimento em menor tempo, nunca inferior à metade da pena privativa de liberdade fixada, de acordo com o art. 46, §4°, do CP.
A pena de prestação de serviços consiste na atribuição aos condenados de tarefas gratuitas junto à entidades assistenciais, hospitais, escolas, orfanatos e outros estabelecimentos congeneres, em programas comunitários ou estatais, que serão designados pelo Juiz na execução.
Quanto à InterdIção temporária de direitos, ficam os condenados proibidos a) de exercer cargo, função, atividade púbIica ou mandato eletivo, assim como qualquer profissão, atividade ou oficio que dependam de habilitação especial, de licença ou autorização do poder público; b) de inscrever-se em concurso, avaliação ou exame públicos; c) e de freqüentar determinados lugares, tais corno casas noturnas, bares, boates. casas de jogos e de prostituição e quaisquer estabelecimentos congéneres.
Ressalte-se que as penas restritivas de direitos poderão novamente ser convertidas em privativas de liberdade quando ocorrer o descumprimento injustificado das restrições impostas.
Em razão desta substituição (PPL por PRD), deixo de aplicar ao sentenciado João Batista a suspensão condicional de pena prevista no ait. 77, do CP, Que prevê:
“Art 77 – A execução da pena privativa de liberdade não superior a 2 (dois) anos, poderá ser suspensa, por 2 (dois) a 4 (quatro) anos desde que:
I – o condenado nao seja reincidente em crime doloso;
II – a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e personalidade do agente, bem como as circunstancias autorizem a concessão do beneficio;
III – Não seja indicada ou cabível a substituição prevista no art. 44 deste Código.
A propósito da questão, Guilherme de Souza Nucci aplica que “somente e aplica o sursis caso não caiba substitulção da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos”. É nitidamerte reconhecido pela doutrina e pela jurisprudencia que a pena restritiva de direitos é mais favorável que a suspensão condicional, de modo que o Juiz deve aplicá-la sempre que for possiver”.
Ante o exposto, em harmonia com o parecer ministerial, conheço e dou provimento ao presente recurso, absolvendo os apelantes do crime do art. 35 da Lei no. 11.343/2006 e mantendo a condenação pelo delito do art. 33, do mesmo diploma legal, fixando definitivamente , a pena de 2 (dois) anos e 7 (sete) meses de reclusão e 263 (duzentos e sessenta e três) dias-multa, substituida a pena privativa de liberdade per duas restritivas de direito, a serem cumpridas pelo mesmo período, facultado o cumprimento em menor tempo, nunca inferior à metade da pena privativa de liberdade fixada, de acordo com o art. 46, §4°, do CP; e para João Batista dos Santos Júnior, 1 (hum) ano e 8 (oito) meses de reclusão e 167 (cento e sessenta e sete) dias-multa, também substituida a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direito, por igual períod, facultado o cumprimento em menor tempo, nunca inferior à metade da pena privativa de liberdade fixada, de acordo com o art. 46, §4° do CP, da maneira como especificado acima.
É como voto.
Em tempo, conforme observação feita pelo Ministério Público, às fls. 140, retifique-se o nome da Apelante na capa do processo no sistema SAJ, de acordo com sua carteira de identidade, às fls. 36.
Manaus, 22 de Março de 2012.
CARLA MARIA SANTOS DOS REIS
Relatora
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Obs 1: Qualquer erro de digitação, peço que me avisem. Eu mesmo digitei durante o fim de semana as 14 páginas do voto. Erro meu, corrijo eu.
Obs 2: Como deixar de mencionar o sucesso alcançado pelo Escritório “Aufiero & Associados”, dos queridos Aniello, Denize e Dani Aufiero? A última, Dani, esteve na sessão para sustentação oral e defesa da Apelação. Que recebam o devido reconhecimento.
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